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ENTREVISTA 

Angela Consiglio

São Paulo /São Paulo

Entrevista realizada em Março de 2025.

Sou Angela Consiglio, mulher cis, sapatão, professora, conrinthiana, atriz, performer, pesquisadora, cafezeira e geminiana. Eu já tentei largar do teatro uma porção de vezes, mas quando fico longe me perco de mim, daí eu volto.

Uma pessoa com cabelo castanho encaracolado usa um top vermelho sem mangas, saia e botas pretas, com uma pochete e tatuagens

como o teatro entrou na sua vida?

Eu tive meu primeiro contato com o teatro em uma oficina cultural gratuita na cidade de São José dos Campos, interior de São Paulo. (Viva as políticas públicas!!) E me apaixonei! O teatro apaixona né?! Um exercício que me marcou foi parar para olhar a outra pessoa. Só isso e apenas isso. Que profundo!! Meu corpo todinho reagiu. Eu com 14/15 anos que nunca tinha parado para olhar nos olhos das pessoas, senti algo que sabia que era grandioso. Fui pega! Acho que foi ali eu fui pega pelo teatro. Nunca mais parei, até me mudar para São Paulo capital para cursar uma graduação em Teatro pelo PROUNI (Viva as políticas públicas!).
Costumo dizer que minha formação na fase adulta foi realizada pela Universidade juntamente com a Cia Estável de Teatro. Durante dois anos, (metade do tempo de graduação) participei dos laboratórios de criação oferecidos pela Cia no Arsenal da Esperança- espaço de acolhida para homens em situação de vulnerabilidade social.
O teatro pra mim se tornou instrumento de denúncia e anúncio, um lugar de luta e de festa desde meus primeiros anos em São Paulo. Conheci e me formei como público também com grupos, cias e coletivos que fizeram parte do movimento que ajudou a criar a Lei de Fomento ao Teatro da cidade de São Paulo, e outras tantas pautas e conquistas políticas. Gente de luta! Gente que fazia e faz teatro de pesquisa, na periferia, na militância, etc, etc, etc. É desse lugar de teatro que venho. Me tornei atriz, nesse contexto.

Fale um pouco pra gente sobre sua trajetória no teatro até os dias atuais.

Durante minha trajetória fui parte de diversos coletivos de pesquisa teatral na cidade de São Paulo e Guarulhos. Foi sempre um processo delicioso e exaustivo. Delicioso por dedicarmo-nos à pesquisa e criação de espetáculos que acreditávamos ser movimento para se escancarar questões políticas e sociais, mas exaustivo pela falta de constância de políticas públicas ou outros modos de manutenção desse fazer. Muitas ações com recursos próprios, outras que ficaram apenas no papel, alguns coletivos desfeitos e outros que seguem na luta. Mas eu sigo insistindo nessa pulsação hoje com o Boleia Coletiva- Teatro Sapatão. Em 2024 integramos a programação da SerformanceP 8° Mostra Internacional de Performance Arte de São Paulo com "Celebre-acão: noite de pregação sapatão" que é uma fresta aberta pela Boleia para movimentar corpo sapatão no mundo, um convite à comunhão e à confabulação de imaginários.

O que você tem investigado ultimamente?

Há algum tempo meu trabalho artístico tem imbrincado minha vivência enquanto uma mulher lésbica capturada por longos anos pela heterossexualidade compulsória. Aquilo que são minhas entranhas e sua relação com os contextos sociais, políticos e culturais foi a forma que aprendi a criar artisticamente para mim e para o mundo. Não consigo de outra forma. E hoje nada mais pulsa tão fortemente em mim, quanto criar movimento de corpo sapatão nesse mundo.
Junto disso, um crescente interesse de pesquisa pelo que poderia ser uma “estética dissidente”. Como fazer teatro sapatão sem recorrer aos ranços das linguagens hegemônicas, sabe?! Que servem a quem?
Enfim, muitos questionamentos, experimentações, ódio, tesão e seguimos assim.
 

Pessoa com balaclava preta e camisa rosa examinando um sapato, em um fundo multicolorido e vibrante, que parece ser um palco

Boleia foto @serformancesp

Durante sua trajetória no teatro você trabalhou com muitas sapatonas?

Não. Antes de estar em coletivas de mulheres lésbicas e bissexuais, trabalhei apenas com duas sapatonas num coletivo de teatro de luta, periférico e tals, mas majoritariamente masculino e gay.

Você já atuou/trabalhou em outras peças com temática sapatão? 

Antes da Boleia, fiz parte da Ybyrá Teatro das Oprimidas, coletiva de mulheres lésbicas e bissexuais, e criamos a vídeo peça “Elas se juntaram: memórias do amanhã” que integrou a programação do “Festival Internacional Ma(g)dalenas em Movimento”.
Participei de uma residência artística no SESC 24 de maio em São Paulo, onde estudamos e criamos a performance "Corpo-Levante em comemoração aos 40 anos do Levante do Ferro's Bar".
Participei dos Laboratórios de criação do "Sapatrônica- guia audiovisual de memórias e afetos". Experiência massa com gravação de audio-experiências.
Participei também do Laboratório de criação - Programas para Desentranhar-se também com as temáticas de gênero, sexualidade e destruição do capitalismo, da heterocisnorma, etc etc rs
E criei em processo solo o que chamei de Ação-cena-fresta-festa sobre (r)existência. Que apresentei no Clube Lesbos Guarulhos e no Mapa Aberto do projeto Sapatrônica.
 

Na sua opinião, qual a importância de se afirmar sapatão, nas coisas cria?

Nossa! Eu quero ser "profissão: sapatão". Do tanto que acho necessário afirmar e gritar por aí nossas existências. Você estuda o que? Sapatonices? Você trabalha com que? Arte Sapatão. Você vai em qual rolê? rolê sapatão... é sobre!

Conta pra gente uma memória, uma história, uma situação

Eu sempre fui completamente encantada por mulheres que me cercavam na infância e adolescência. Para algumas, até escrevia cartas, sonhava, queria ficar perto, queria ser abraçada... Enfim, e fui me entender sapatão aos 27 anos.

"...Eu quero ser "profissão: sapatão". Do tanto que acho necessário afirmar e gritar por aí nossas existências. Você estuda o que? Sapatonices? Você trabalha com que? Arte Sapatão. Você vai em qual rolê? rolê sapatão... é sobre!" Angela Consiglio

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