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ENTREVISTA 

Beatriz Belintani

São Paulo / São Paulo

Entrevista realizada em Março de 2025.

Artista e pesquisadora. Transita entre as áreas de atuação, dramaturgia e curadoria de projetos artísticos e artístico-pedagógicos. Dá aulas de teatro e dedica-se à criação, pesquisa e prática nas artes cênicas contemporâneas a partir da relação entre estética e política, e investiga as qualidades narrativa e performativa no teatro, com foco na busca por uma estética lésbica.

Uma mulher em um palco, com vestido preto e fones de ouvido, parece estar em uma apresenta

como o teatro entrou na sua vida?

Comecei a estudar teatro com sete anos em um curso livre na escola e nunca mais parei. E mesmo no curso livre sempre levei muito a sério, fazia teatro e era muito ligada ao cinema. Logo acabei percebendo que queria ser atriz profissionalmente, então busquei diversos cursos, grupos de teatro, fiz contatos e fiz o curso profissionalizante.

Fale um pouco pra gente sobre sua trajetória no teatro até os dias atuais.

Fui atriz integrante do Teatro da Vértebra entre 2016 e 2021 e fundei a Cia. Queda Livre em 2017, na qual mantive atividade constante de pesquisa e produção artística até 2023. Sou a idealizadora, ao lado de Fabiana Monsalú, de O Espaço Vazio, um território dedicado ao encontro, formação e prática das artes contemporâneas, relacionais e performativas. E hoje integro a CompanhiaDaNãoFicção.

Profissionalmente, atuei nas peças “Na Madrugada” (2013), “Assim Era o Rádio” (2013), “Hey Zanna” (2015), “Jogos na Hora da Sesta” (Teatro da Vértebra - 2016 a 2018), “Cantos de Coxia e Ribalta” (2018 a 2019), “Pés Descalços Não Fazem Barulho” (2018), “Entre 4 Paredes” (Cia. Queda Livre - 2018) “Cansei de Tomar Fanta” (2019), “O Verdugo” (Teatro da Vértebra - 2019), “A Valsa nº 6” (Cia. Queda Livre - 2019), e "Eu Amo Chris - Uma pequena coleção de fracassos" (Coletivo Teatro Dodecafônico - 2023 - ainda circulando).

Sou criadora e atriz do curta-metragem “SÓS” (2020), contemplado pelo Prêmio Funarte RespirArte, e da peça-vídeo “SÓS: Ao cair de mim morrerei vivendo” (2021), trabalho híbrido que concebi entre teatro e vídeo e apresentei com a Cia. online e ao vivo, no qual, além de atuar, também dirigi e escrevi com apoio da Lei Aldir Blanc, e que participou da Mostra Videográfica do FarOFFa em 2022, ano em que também publiquei a dramaturgia pela editora La Lettre em parceria com a artista Camila Couto para a criação de uma experiência de leitura-escuta. A pesquisa entre Camila e eu deu origem ao podcast "Dramaturgia Expandida" disponível no spotify, que conta com a participação das artistas Aline Bei, Aíla e Ligia Souza.

Em 2020 criei e executei a edição e montagem da experiência cênico-performativa audiovisual “ExperimentosSelvagens.br” com direção de Fabiana Monsalú. Em 2021 fiz assistência de direção e de dramaturgia do acontecimento performativo sensorial “Fim de Festa: Um mergulho para remixar a realidade” da CompanhiaDaNãoFicção, com direção de Fabiana Monsalú, que estreou em 2021 no Estudio NU, fez parte da Virada Cultural pelo Sesc 24 de Maio em 2022, cumpriu temporada em maio de 2023 no CCSP e fez parte da Virada Cultural pelo Teatro Artur Azevedo em 2024. Fui Embaixadora do projeto TODXS 2024 e sou curadora do AMOREIRAS – 1º Festival LGBTQIA+ do Vale do Paraíba, com 1ª edição em 2022 e 2ª edição em 2025. ​

O que você tem investigado ultimamente?

Atualmente, investigo a estética lésbica no teatro contemporânea. No dia 28/03 eu estreio a palestra-performance que é o ponto em que estou dessa pesquisa, chamada "Meu corpo em terra corre para o mar como tartaruga marinha" no Sesc Bom Retiro. Trata-se do novo trabalho da CompanhiaDaNãoFicção, que escrevi e atuo e a direção é da Fabiana Monsalú.

O solo nasce da afirmação da pensadora Monique Witing “lésbicas não são mulheres” e convida o público para um exercício radical de imaginação, a partir do corpo da lésbica na sociedade. O trabalho propõe criar outras perspectivas de “(con)vivência”, afeto e liberdade, confrontando conceitos do feminismo e da teoria queer em uma imersão sensível e poética.

Propomos um jogo cênico entre o corpo da lésbica na sociedade e a luta pela sobrevivência das tartarugas marinhas como metáfora desse corpo e sua maneira de sobreviver, já que esses animais nascem na terra e imediatamente correm para o mar para viver sua liberdade.

O trabalho nasce do desejo e da necessidade de existirmos livres de qualquer forma de controle social, cultural ou político. E, mais do que isso, de vivermos em uma espécie de alegria anárquica. Por isso, escolhemos esse ser que vive em alto-mar, zonas marítimas que não se encontram sob jurisdição de nenhum Estado”.

A escritura cênica é alinhavada com fatos reais da história, depoimentos em verbatim e textos de autoras latino-americanas, europeias e norte-americanas, criando um espaço de diálogo entre o perigo iminente e a aspiração por um futuro utópico. Entre essas pensadoras, estão Monique Wittig (1935 – 2003), Audre Lorde (1934 – 1992), Gayle Rubin, Jota Mombaça, Simone de Beauvoir (1908 – 1986), Verónica Gago e Judith Butler.

Mais do que nunca, em tempos que correm, é necessário encontrar o coração das pessoas para fazer ecoar "uma visão de mundo pela qual as pessoas desejem viver em igualdade, liberdade e justiça", como defende a norte-americana Judith Butler. Por isso, a dramaturgia da imagem propõe ao espectador a experiência de uma contraimaginação.

O espetáculo faz parte do projeto Brejo do Bom, uma programação do Sesc Bom Retiro que traz à cena o protagonismo de artistas e pesquisadoras sáficas.

Uma pessoa com fones de ouvido e casaco branco, com uma faixa amarela com a palavra "KYKONA" visível, tem uma expressão séria

Tartaruga (Camomila Produções)

Durante sua trajetória no teatro você trabalhou com muitas sapatonas?

Já trabalhei com muitas sapatonas ao longo da minha trajetória no teatro e é sempre bom trazer a nossa perspectiva nos trabalhos, seja como atriz ou qualquer outra função.

Você já atuou/trabalhou em outras peças com temática sapatão? 

Nunca especificamente em uma peça com temática sapatão, essa que estou criando é a primeira nesse sentido, mas já fiz peças que tratavam de questões e gênero e sexualidade em geral, e de peças feministas nas quais eu mesma levei discussões e textos e cenas lésbicas.

Na sua opinião, qual a importância de se afirmar sapatão, nas coisas cria?

Eu considero que os corpos lésbicas, vivências e narrativas precisam estar cada vez mais presentes no teatro (e em todos os lugares haha), desde que a importância de se afirmar seja o desejo das artistas que estão no trabalho em questão. Nossos corpos já nos afirmam, mesmo que não falemos sobre isso. Nossos corpos já o são. Nossos corpos lésbicas em cena, ou na direção de uma peça, ou escrevendo uma dramaturgia, já carregam nossas vivências e experiências, então não acho que "precisamos" ou "devemos" sempre falar sobre isso e sim sermos livres para falar sobre o que quisermos, para sermos personagens heroínas ou vilãs, mães, avós, adolescentes, professoras, solteiras ou casadas, traidoras ou fiéis, coerentes ou irracionais, certinhas ou loucas, com saúde ou doentes, mas sempre capazes de emocionar.

"...Nossos corpos já o são. Nossos corpos lésbicas em cena, ou na direção de uma peça, ou escrevendo uma dramaturgia, já carregam nossas vivências e experiências, então não acho que "precisamos" ou "devemos" sempre falar sobre isso e sim sermos livres para falar sobre o que quisermos..." Beatriz Belintani

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