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ENTREVISTA 

DENISE LEAL

Entrevista realizada para o primeiro mapeamento publicado em dezembro de 2021

Denise Leal é atriz e produtora cultural.

Formou em teatro pelo CEFART- Centro de Formação Artística e tecnologia Palácio das Artes de Belo Horizonte - MG em 2010. É graduanda em Artes Cênicas pela UFGD.

Mineira de Sabará, mas atualmente está morando em Dourados  no Mato Grosso do Sul, onde fica a universidade em que estuda. Nesses 11 anos trabalhando profissionalmente com teatro, realizou diversos trabalhos em cena e como produtora cultural. Atualmente atua nas Vagamundas como atriz e no Casulo como produtora.

como o teatro entrou na sua vida?

Denise: Quando tinha 7 anos, assisti em Sabará o espetáculo de rua Romeu e Julieta do grupo galpão. Aquilo me tocou de uma forma tão profunda, que eu desejei naquele momento que eu queria fazer aquilo, tocar as pessoas. Então comecei a fazer teatro na escola, em casa, nas festas de família.mas foi só aos 18 que comecei um curso livre de teatro de rua e circo com a trupe pirulinga em Sabará, e aos 22 fiz a prova do CEFART.
Sou formada em engenharia ambiental e por um bom tempo fiquei dividida entre as 2 profissões, entre a estabilidade financeira e a felicidade, satisfação e desejo em fazer teatro. Até que em 2011, eu larguei tudo pra me dedicar apenas ao teatro.

conta um pouco da sua trajetória

Denise: Comecei com o teatro de rua amador, trupe pirulinga, na cidade de Sabará. O que era pra ser apenas um curso livre de teatro de rua e circo, virou um grupo de teatro na cidade. E por 5 anos atuei com a trupe pelas ruas, escolas e teatros da cidade. O teatro de rua é uma paixão pra mim. Poder chegar em qualquer lugar com arte. Em seguida fui estudar teatro no Cefar, e assim que me formei comecei a trabalhar com o grupo espanca, lá trabalhei com produção e conheci muita gente, muitos festivais, por 4 anos. Em 2012 entrei pra Cia Quinta Marcha, junto com Dayane Lacerda, onde começamos um trabalho mais de pesquisa, do teatro do real, onde começou a nascer o espetáculo se essa rua fosse minha que veio a estrear em 2014. Participei do projeto pé na rua do galpão cine horto em 2013 com Fábulas errantes, direção de Mariana Muniz e A Tardinha no Ocidente com a Primeira Campainha em 2014. Em 2014 estreei o espetáculo Se essa rua fosse minha - um solo de Macaxeira, com direção de Juliana Pautilla, onde fomos indicados a 3 prêmios do Sinparc (peça, direção e atriz) onde ganhei o prêmio de melhor atriz. Em 2015 formamos um grupo de teatro (Eu, Dezin, Batatinha, Krisp e Nath) em Sabará, Sóbrilá Cia de Teatro e um Centro Cultural. Além de dar aulas de teatro, criamos 2 espetáculos, um de rua com a nossa direção e outro no nosso galpão com direção de Rodrigo Jerônimo. Em 2017 fui convidada pelo grupo espanca pra fazer parte do primeiro espetáculo de rua do grupo, Passaarão, com direção de Aline Vila Real. Nesse mesmo ano fui convidada pela Oitis Produções pra fazer o espetáculo infantil Berenice e Soriano, com direção de Fernanda Vianna. Em 2018 me mudei pra Dourados no Mato Grosso do Sul, onde desde então trabalho na produção cultural do Casulo espaço de cultura e arte. Aqui atuo em 2 coletivos, Vagamundas com Arami Arguello e As Lagartas com Jaciara Marschner e Arami. Por aqui já fiz 5 cenas curtas, e 1 espetáculo, Quarança com direção de Camile dos Anjos. Em 2020 fui convidada pelo grupo Faz me rir de Sabará/BH para dirigir uma cena que poderia virar um espetáculo de rua, e com a PANDEMIA acabou virando um video, A rua O rio. Por aqui, nesse momento de PANDEMIA, tenho experimentado também, teatro de bonecos, teatro de papel, podcast e alguns vídeos curtos.

O que você tem investigado ultimamente?

Denise: Antes da PANDEMIA, a gente (vagamundas) estava em uma pesquisa, de um teatro pra ser feito em qualquer lugar. Pra sair viajando pelo Brasil apresentando em qualquer lugar, rua, praça, casa, quintal e até em Teatro. Mas aí veio a pandemia e isso ficou impossível. Então começamos a pesquisar formas mais "possíveis" de criar nesse momento, como podcast, teatro de papel, boneco e pequenos vídeos mais perfomativos. Porque estar de fato em cena nesse momento, sem o público, pra mim é quase impossível, na verdade impossível mesmo. Tá difícil né! Mas a gente tá se reinventando todo dia, pra sobreviver. A arte ta nos salvando. Sempre salvou né, mas agora mais.

Durante sua trajetória no teatro você trabalhou com muitas sapatonas?

Denise: Na direção tive Grace Passo, Marina Arthuzzi e Marina Viana. Como assistente de direção tive Dayane Lacerda em BH e Camile dos Anjos aqui em Dourados. Em cena tive algumas parceiras sapatonas, mas durante esses 11 anos de teatro só agora, em 2020, levei esse tema pra cena: com o trabalho A rua o Rio e com o podcast ou áudio cena Safo de Lesbos.

e porque só agora, em 2020? 

Denise: E agora fico me questionando o pq. Apesar de ter trabalhado com mulheres sapas, não tinha trabalhado com a temática sapatão. Não sei explicar bem o pq não ter trabalhado com esse tema, talvez por pensar que o fato de eu ser, já era suficiente. Mas é claro que se a gente leva isso pro palco, através da arte, a gente pode quebrar barreiras, preconceitos e por isso é importante sim, falar sobre isso na nossa arte. Hoje tenho mais clareza disso. É tanta coisa que a gente quer "gritar" por aí, que muitas vezes a temática sapatão não fica explícita. Mas é uma coisa pra se pensar e discutir mais e mais. Precisamos falar sobre isso.

Conta pra gente sobre seu trabalho de direção junto com a FazMeRir de teatro - a cena A Rua, o rio (2020)

Denise: Eu nunca tinha dirigido um trabalho com um grupo profissional. Já tinha feito direção com meus alunos de teatro. E quando recebi o convite, achei desafiador, pessoalmente e principalmente enquanto artista. E como amo desafios, eu topei!!! O mais difícil com certeza não foi a direção em si, mas a distância, distância por conta da PANDEMIA e a distância de morar longe também. Fiquei muito instigada com a temática, fiquei animada por ser um projeto a ser realizado na rua, fiquei empolgada. Já tinha visto as máscaras de sapas no carnaval (por fotos) e fiquei com muitas ideias pra fazer intervenções urbanas com essa bicharada. Não vou negar que dirigir era desafiador pra mim pq a vontade mesmo era de estar em cena, estar juntes. Mas a distância realmente foi foda. No início, apenas eu estaria longe, mas o grupo estaria perto. Mas com a PANDEMIA ficamos todes longes um do outro. E o que era pra ser uma cena de rua e provavelmente um espetáculo de rua, virou um vídeo. Putz... Aí eu fiquei quase perdida. Se dirigir teatro já era algo novo pra mim, dirigir um vídeo achei q seria impossível. Quase pensei me desistir. Mas esses multiartistas Nádia, Gui, Éle, Letícia e Laís são muito especiais e generosos. E a cada encontro virtual, nas janelinhas do zoom, quando eu olhava nos olhos de cada um eu me inspirava e via quanto era necessário a realização desse trabalho. Pra mim, esse trabalho ainda não acabou. Ainda desejo ver essas máscaras invadindo as ruas.

Pessoa sentada no chão usando máscara de sapo em cenário urbano histórico.

Processo da cena A rua, o RIo

Direção de Denise Leal

Arquivo pessoal

"Em cena tive algumas parceiras sapatonas, mas durante esses 11 anos de teatro só agora, em 2020, levamos esse tema pra cena. com o trabalho A rua o Rio e com o podcast ou áudio cena Safo de Lesbos." Denise leal

pessoa branca com cabelo curto e escuro, de perfil, com as mãos juntas e cobertas por uma substância escura

Denise Lopes Leal
Arquivo pessoal

como foi o processo criativo de "a rua , o rio?

Denise: Fazer teatro é difícil. Não é fácil. Mas fazer teatro na PANDEMIA é quase impossível. É impossível. O que era pra ser uma cena de teatro acabou virando um video. Foi um processo criativo bem desafiador, pra mim, nesse lugar de provocadora criativa dos artistas. Acho que só foi possível por ter sido um projeto mais horizontal. Eu não era "a Diretora" que decide tudo. Todes tinham voz, eu me sentia junto. E não eu era a Diretora e eles era meus atores. Nada disso, foi em todo momento coletivo em todas as decisões.

Recentemente você, junto com a Arami Arguelo, criaram uma audio-cena sapatônica chamada "Safo de Lesbos." Como surgiu essa ideia e como foi o processo criativo?

Denise: Moramos numa chácara, desde novembro, antes da PANDEMIA, e depois de 4 meses morando nessa casinha veio a PANDEMIA. E aos poucos fomos transformando nossa casa em uma residência artística. A gente criava pra tentar respirar um pouco. Mas a gente não tinha ainda criado nada com essa temática explicitamente. Até que veio o convite das Fanchecleticas, pra gente participar de uma live. E aí, na hora a gente já pensou em criar algo especialmente pra essa live e com a temática sapatão. Foi muito gostoso e libertador. E aí a partir dessa cena, enviamos um projeto pra lei aldir Blanc daqui, pra criar um podcast, o q virou uma áudio cena com a dramaturgia da cena que a gente tinha apresentado na live. E aí com o retorno das mulheres, principalmente das mulheres sapas, ficamos muito felizes e com um desejo imenso de falar mais sobre isso, sobre o amor, sobre nossa relação, sobre nós mulheres sapas. Sobre a nossa história.

Como o trabalho "Safo de lesbos" foi recebido pelos ouvintes?

Denise: Foi muito lindo ouvir o retorno das mulheres, principalmente das mulheres sapas. Tivemos um retorno muito afetivo e positivo. Inclusive sobre as falta de conteúdo produzido em teatro a partir de referências, a partir do tema sapatão. Como estamos carentes de peças, textos, que realmente nos representam... Esse trabalho tá fazendo a gente refletir muuuuuuito sobre a arte sapa. Como é difícil encontrar dramaturgia nesse tema. Então, nós enquanto artistas precisamos levantar materiais, produzir materiais. E fazer isso chegar cada vez mais em mais pessoas.

Na sua opinião, qual a importância de se afirmar sapatão, nas coisas que a gente cria?

Denise: Se assumir publicamente é encorajar outras pessoas também a se assumirem, a falar disso, a pensar, refletir. A gente começa a criar conteúdo sobre o que é ser sapatão, sobre o que é fazer teatro sendo sapatão e começamos a criar referências. Na arte, no teatro é muito importante ser quem nós somos, antes de ser outros personagens.

Conta pra gente uma memória, uma história, uma situação... qualquer uma

Denise: Quando eu comecei a fazer teatro, eu senti a necessidade de ser eu. E eu era sapatão. Mas não conseguia assumir isso pra outras pessoas. Mas o pior era não conseguir assumir pra mim mesma. E no teatro, com as pessoas que faziam teatro, nesse meio artístico, eu me sento tão acolhida, tão normal, tão livre. Que eu pude então viver uma vida que realmente era minha. E isso demorou, eu já tinha mais de 20 anos. Por isso é muito importante esse trabalho das Fanchecleticas, além de artístico é quase um trabalho social, de acolhimento, de amor, de união, de mostrar pra cada sapa que elas não estão sozinhas. Que a arte vai nos salvar e que a lagoa tá cheia de sapa linda, de mulheres incríveis que não precisam se esconder nos armários.

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